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Crédito: Reprodução da Internet
Hoje, dia 25 de maio de 2025, a Igreja Católica testemunhou um dos ritos mais solenes e eclesiologicamente significativos de seu calendário: a posse do Papa Leão XIV na cátedra episcopal da Arquibasílica de São João de Latrão, que marca oficialmente o início de seu ministério como Bispo de Roma.
Enquanto a Missa de inauguração do pontificado, realizada dias antes na Praça de São Pedro, é um rito de dimensão universal, a celebração em Latrão revela o vínculo do Papa com sua diocese, Roma. Essa cerimônia, enraizada na tradição mais antiga da Igreja, tem um valor pastoral, teológico e simbólico de altíssima importância.
O Concílio Vaticano II reafirmou com clareza o duplo papel do Papa como pastor da Igreja universal e bispo da Igreja local de Roma:
“O Romano Pontífice, como sucessor de Pedro, é o perpétuo e visível princípio e fundamento da unidade, tanto dos bispos como da multidão dos fiéis” (Lumen Gentium, 23).
“O Papa, por ser Bispo de Roma, é o chefe do Colégio Episcopal” (Lumen Gentium, 22).
A celebração da posse em Latrão é, pois, a expressão visível desta realidade: a autoridade universal do Papa brota de seu enraizamento local como sucessor dos apóstolos na cidade de Pedro e Paulo.
Esse documento dogmático reforça a missão petrina como instituição divina:
“Em virtude da disposição do Senhor, o Romano Pontífice possui sobre a Igreja universal o poder ordinário do primado, e este poder é verdadeiramente episcopal.” (Pastor Aeternus, cap. 3)
Assim, ao tomar posse de sua cátedra em Latrão, o Papa não assume apenas uma função honorífica, mas exerce um primado instituído por Cristo e perpetuado pelo Espírito Santo na sucessão apostólica.
A cátedra (do grego kathédra – cadeira) não é mero mobiliário litúrgico, mas representa o munus docendi (múnus de ensinar) do bispo. No caso do Papa, a cátedra de Latrão é sinal de que seu magistério está a serviço da verdade revelada, e não de opiniões pessoais.
“A cátedra é símbolo da autoridade do magistério, que é sempre serviço à Palavra de Deus” – Papa Bento XVI, 2012.
Ao sentar-se nela, o Papa faz memória do próprio Cristo, que ensinava sentado (Mt 5,1), e dos Apóstolos, a quem foi confiada a missão de anunciar com autoridade o Evangelho.
“Eu sou servo dos servos de Deus. Nada me eleva, senão o peso da responsabilidade de minha função.” (Epístolas, I,24)
Gregório Magno rejeitou o título de “bispo universal” em sentido político, preferindo o de “servus servorum Dei”, expressão ainda hoje usada por todos os papas. Essa concepção reaparece claramente nas palavras de Leão XIV na homilia da posse: oferecer-se inteiramente, mesmo sendo “pouco”, como instrumento de Cristo e da Igreja.
“Onde está o bispo, ali esteja o povo; assim como onde está Jesus Cristo, aí está a Igreja Católica.” (Carta aos Esmirnenses, 8)
A presença do Papa na sua cátedra de Latrão torna visível essa verdade eclesial: o ministério episcopal é o elo entre o Cristo Cabeça e o seu Corpo, a Igreja.
A dedicação da Basílica de São João de Latrão por Constantino não foi mero ato político, mas uma consagração da autoridade espiritual de Roma. Durante séculos, os papas residiram ali (antes da mudança para o Vaticano), e é nesta basílica que ocorreram importantes concílios ecumênicos (Lateranenses I a V), reafirmando sua importância para a história da fé católica. Ela foi construída pelo imperador Constantino e dedicada no ano 324, é a catedral do Papa, pois ele é, antes de tudo, o Bispo de Roma. Embora muitos associem o Papa ao Vaticano, é em Latrão que se encontra a cátedra – o trono episcopal que simboliza sua autoridade magisterial e pastoral sobre a Diocese de Roma.
Além disso, a basílica está intimamente ligada à vida sacramental da Diocese de Roma: é nela que se encontram os batistérios mais antigos da cristandade ocidental, o que ressalta o papel do Papa como “pai na fé” de seu povo local. A inscrição na fachada da basílica resume seu papel: Omnium urbis et orbis ecclesiarum mater et caput – “Mãe e cabeça de todas as igrejas da cidade e do mundo”. Latrão é, assim, o coração da comunhão entre o Papa e as Igrejas locais espalhadas pelo mundo.
A celebração de posse na cátedra episcopal do Papa é um rito distinto da inauguração do pontificado. Liturgicamente, é uma missa solene com elementos próprios, destacando a missão do Papa como sucessor dos Apóstolos e pastor da Igreja local de Roma.
O Papa foi recebido na entrada principal da Basílica pelo Cardeal Vigário de Roma, dom Baldassare Reina, que lhe apresentou a cruz processional e aspergiu a assembleia com água benta, sinal de purificação e renovação batismal. Este gesto recorda que todo episcopado é prolongamento do ministério apostólico fundado por Cristo.
Após o canto do Gloria, realizou-se o rito central da celebração: o Papa sentou-se na cátedra episcopal da Basílica. Este gesto, carregado de simbolismo, expressa a plenitude do magistério apostólico conferido a Pedro e seus sucessores.
A cátedra, no contexto católico, é símbolo de autoridade para ensinar com fidelidade ao Evangelho. Sentar-se nela não é sinal de poder terreno, mas de serviço e responsabilidade pastoral. Trata-se de um rito enraizado na Tradição: a partir do século IV, o bispo era reconhecido em sua autoridade quando assumia publicamente sua cátedra.
Durante a cerimônia, representantes do clero romano, religiosos, religiosas e fiéis leigos da diocese dirigiram-se ao Papa para manifestar sua obediência e comunhão com o novo bispo. Esse gesto é uma expressão concreta da unidade da Igreja local com seu pastor e, por consequência, da Igreja universal com o sucessor de Pedro.
Em sua homilia, Leão XIV traçou as linhas pastorais de seu ministério em Roma. Citando Santo Agostinho, recordou que o bispo deve estar “com o povo e para o povo”, partilhando alegrias, sofrimentos e esperanças. Inspirado também no Papa João Paulo I, o novo pontífice destacou a ternura como chave para a evangelização num mundo marcado por desumanização, e reafirmou o desejo de escutar profundamente cada fiel, especialmente os mais frágeis e esquecidos.
A frase que marcou a celebração foi: “Ofereço o pouco que sou, para ser todo de Cristo e da Igreja” – um eco do “Totus Tuus” de São João Paulo II, mas com a marca humilde e pastoral de Leão XIV.
Encerrando a cerimônia, o Papa dirigiu-se à sacada principal da Basílica e concedeu uma bênção especial à cidade de Roma, com a fórmula tradicional usada por seus predecessores. Este gesto reforça que o bispo é, antes de tudo, pastor de um povo concreto, e que a missão do Papa começa pelo cuidado da cidade que abriga o túmulo de São Pedro e o coração da cristandade.
A posse em Latrão não é apenas um gesto cerimonial. Ela concretiza a teologia do episcopado expressa no Concílio Vaticano II, especialmente na Lumen Gentium, que afirma que o Papa é, ao mesmo tempo, chefe do Colégio Episcopal e bispo de uma diocese local real e concreta, chamada a ser exemplo para toda a Igreja.
Ela também reflete o princípio da comunhão, já que o ministério petrino só faz sentido em relação ao corpo dos fiéis. O Papa não governa como um soberano, mas como um pai, cuja autoridade está ancorada no serviço, no amor e na verdade revelada.
Com esta celebração em São João de Latrão, Papa Leão XIV inaugura oficialmente seu ministério episcopal em Roma, dando um rosto humano e pastoral à missão universal que lhe foi confiada. No silêncio daquela basílica milenar, ecoaram os votos de uma Igreja que deseja permanecer fiel a Cristo, unida ao seu pastor, e comprometida em anunciar o Evangelho com coragem, ternura e fidelidade.
A posse papal em São João de Latrão é muito mais que uma cerimônia simbólica. Ela é a manifestação sacramental e pastoral da eclesiologia católica: o Papa é sucessor de Pedro, sim, mas o é dentro do colégio dos bispos, como irmão e pastor, com a missão de confirmar seus irmãos na fé (cf. Lc 22,32).
A partir de sua cátedra, ele ensina, governa e santifica — mas sempre como servo, jamais como dominador. Como disse São João Paulo II:
“O Papa é o primeiro a obedecer, porque sua autoridade é serviço, e seu serviço é fidelidade.” (Homilia em Latrão, 1996)
E agora, Leão XIV se une a essa sucessão ininterrupta, começando seu ministério na “mãe de todas as igrejas”, com a promessa de fidelidade, ternura e firmeza na verdade.