USD | R$5,3752 |
|---|
Crédito: Shutterstock/ thanasus
O Credo nasce como fórmula de anúncio e defesa: resultado de séculos em que a comunidade cristã precisou traduzir o kerygma apostólico em frases capazes de manter a fé intacta diante de falsificações doutrinais. As fórmulas antigas — em especial o Símbolo dos Apóstolos e o Símbolo niceno-constantinopolitano — cristalizaram respostas a heresias que, se não fossem contidas, teriam desfigurado a fé sobre a Trindade e a Encarnação. Não é um texto aristocrático para eruditos: é um contrato comunitário que diz quem somos antes de qualquer discussão teológica sofisticada.
O Credo tem uma economia teológica: começa por Deus Pai, passa por Cristo Redentor, avança ao Espírito Santo e culmina na Igreja, nos sacramentos, na ressurreição e na vida eterna. Essa ordem não é arbitrária; é pedagógica: primeiro a fonte (Pai), depois o meio da salvação (Filho), depois a força que vivifica (Espírito) e, enfim, a consequência e o horizonte (Igreja e vida eterna). A economia do texto revela prioridades pastorais — aquilo em que a Igreja insiste quando quer formar um povo.
O Credo não é manual de teologia sistemática; é um “mínimo indispensável” que protege o depósito da fé. Ao afirmar, por exemplo, a Encarnação ou a ressurreição em termos históricos e não meramente simbólicos, a Igreja delimita o que conta como cristianismo autêntico. Reduzi-lo a metáfora, ou transformá-lo em uma espécie de checklist moral, empobrece sua função. Dizer o Credo é dizer o que nos torna cristãos, não apenas o que nos torna pessoas virtuosas.
“Creio em um só Deus, Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra…” — essa profissão inicial diz em poucas palavras uma realidade que é ao mesmo tempo transcendente e íntima: não um deus qualquer, mas o Deus que entra na história humana para redenção.
O Magistério da Igreja tem a tarefa de guardar e explicar o sentido do Credo. Documentos conciliares, catequeses magisteriais e o próprio Catecismo articulam os artigos do Símbolo para a vida das atuais gerações. Isso significa duas coisas: a) o Credo serve de critério para o que a Igreja pode ensinar; b) a interpretação magisterial procura aplicar os termos clássicos às questões novas sem trocar palavras por modismos. Fidelidade e criatividade são irmãs, não rivais.
Os Padres da Igreja foram os operários intelectuais que traduziram o anúncio apostólico em linguagem robusta frente aos desafios do mundo antigo. Atanásio, os Cappadócios e outros defenderam a terminologia que hoje lemos nas grandes fórmulas credais. Essa tradição patrística confere ao Credo uma profundidade que não é invenção moderna — é continuidade. A tradição não é nostalgia estéril; é memória viva que protege o sentido original.
O Credo só se realiza quando ensinado com método e coragem pastoral. Uma catequese eficaz liga cada artigo a episódios das Sagradas Escrituras, à liturgia e à prática sacramental. Ensinar o que significa crer na ressurreição, por exemplo, exige tanto a explicação histórica quanto exercícios espirituais que levem à esperança efetiva. Formar em credos é formar em compromissos — e isso inclui responsabilidade moral, caridade e testemunho público.
Na missa, o Credo não é apenas repetição ritual: é comunhão intergeracional — o povo que se reconhece nas mesmas palavras que os mártires e os santos pronunciaram. Na espiritualidade pessoal, meditar os artigos do Credo ajuda a ordenar desejos, decisões e afetos em direção à graça. Um fiel que reza o Credo com consciência tem mais chance de ver sua vida sacramental e ética conformada ao mistério que professa. Recitar o Credo com intenção transforma costume em compromisso.
O Credo não é um lastro que prende a comunidade ao passado, nem é uma camisa de força para a investigação honesta. É, isto sim, o compasso que permite à Igreja caminhar firme: ele define, protege e encaminha. Ao reafirmar o que foi recebido, a Igreja não se repete por medo; repete por fidelidade. E essa fidelidade é, no fundo, uma ousadia: a de manter acesa, geração após geração, a única luz capaz de orientar a caminhada humana rumo à comunhão com Deus.