USD | R$5,3894 |
|---|
Crédito: Reprodução da Internet
Em cada século, Deus suscita almas que não se contentam com a mediocridade. São Pedro de Alcântara é uma dessas almas raras. Filho de uma Espanha cristã e turbulenta, nasceu nobre, mas escolheu ser pobre. Desde jovem, o ruído das honras e do mundo não lhe dizia nada. O que o movia era o desejo de pertencer inteiramente a Deus, sem reservas, sem distrações.
A vocação franciscana o encontrou como quem reconhece uma pátria antiga. Viu nos Frades Menores não apenas um modo de vida, mas o eco do Evangelho vivido à risca. O desprendimento e a pobreza de Francisco tornaram-se sua gramática espiritual.
A pobreza que Pedro abraçou não era ideológica nem teatral. Era amorosa. Ele compreendia que só o coração livre das posses é capaz de amar plenamente. Sua austeridade não era um fim, mas uma linguagem. Quando deixava de comer, de dormir ou de se aquecer, não o fazia por desprezo do corpo, mas por amor a Deus, a quem tudo queria oferecer.
A penitência, para Pedro, era forma de educar os sentidos — não de negá-los. Ele dizia que o corpo é um servo fiel quando o espírito o governa, e um tirano cruel quando é deixado sem rédeas. Nessa luta diária, sua vitória não era o sofrimento, mas a paz interior que nasce quando a vontade se submete ao Amor.
Foi nesse caminho silencioso que Pedro se tornou guia de almas. Sua influência espiritual chegou a lugares e pessoas decisivas. Santa Teresa de Ávila, por exemplo, encontrou nele um mestre firme, mas terno. Ela via em Pedro não um teórico, mas um homem cuja vida pregava o que os livros apenas descreviam.
Em suas conversas, ele não multiplicava conselhos: apontava para Cristo. Ajudava a discernir o que vinha de Deus e o que era puro entusiasmo humano. Foi ele quem encorajou Teresa em sua reforma do Carmelo, dando-lhe o alicerce espiritual que sustentaria toda uma obra mística.
São Pedro de Alcântara compreendia que a oração não é um exercício reservado a monges ou eremitas, mas a respiração natural de quem crê. Rezava com o corpo cansado, com o frio cortando-lhe a pele, com a mente distraída, e oferecia tudo como parte da oração.
Dizia que orar é permanecer diante de Deus tal como somos, sem máscaras. E que o verdadeiro silêncio não é a ausência de ruído, mas a quietude do coração que confia. Quando o coração está pacificado, até o vento se torna oração.
Em suas celas frias, rezava pelas almas, pelos sacerdotes, pelos que dormiam espiritualmente. Não pedia conforto, pedia fé. A fé que suporta, a fé que persevera.
O que mais surpreende na vida de São Pedro de Alcântara é que, por trás de tanta penitência, havia ternura. Quem o conhecia dizia que era um homem alegre, acessível, sereno. A mortificação não o endureceu; lapidou-o. A renúncia, quando feita por amor, produz suavidade, não dureza.
É um lembrete necessário: a disciplina espiritual sem caridade vira tirania. Pedro entendia que o jejum só tem valor se gera misericórdia; que o sacrifício só é santo se produz humildade. A verdadeira mortificação — dizia ele aos irmãos — é suportar-se mutuamente em paciência e amor.
O século XVI viu nascer em Pedro não um revolucionário, mas um reformador. Ele não fez discursos inflamados, nem buscou influência política. Reformou pelo exemplo. A observância austera que implantou entre os franciscanos não foi imposição; foi contágio espiritual.
Os que o seguiam percebiam que ele não pedia nada que não vivesse antes. A sua cela era pobre, o hábito gasto, os sapatos inexistentes. O seu testemunho dizia mais do que qualquer regra escrita. Assim nasceram os “alcantarinos”, um ramo de vida simples, dedicado à oração e ao trabalho, sustentado pelo amor à pobreza e à Eucaristia.
Quando morreu, em 1562, Pedro de Alcântara deixou o mundo mais silencioso, mas mais luminoso. A sua morte foi descrita como um adormecer em Deus. Pouco depois, Santa Teresa testemunhou que ele lhe aparecera glorioso, confirmando que a fidelidade escondida é sempre fecunda.
A Igreja reconheceu oficialmente essa santidade ao canonizá-lo, não por ter feito milagres espetaculares, mas porque sua vida inteira foi um milagre de perseverança. Ele mostrou que a santidade não é para os que têm tempo livre, mas para os que se deixam consumir por amor.
Celebrar São Pedro de Alcântara é redescobrir o valor do essencial. Numa época saturada de barulho e pressa, ele nos recorda que é no silêncio que Deus fala. Num mundo que teme o sacrifício, ele ensina que renunciar é libertar-se.
A sua vida é um espelho no qual a Igreja pode ver sua própria vocação: ser pobre, obediente e livre para amar. A penitência, longe de ser castigo, é caminho de cura. E a oração, longe de ser fuga, é modo de permanecer no real com o coração unido a Deus.
Quem contempla Pedro não sente culpa, sente desejo de santidade. Ele não humilha; inspira. Não impõe; convida. Sua austeridade é evangelho vivido com simplicidade: menos palavras, mais presença.
São Pedro de Alcântara permanece como testemunha de que o caminho estreito conduz à liberdade. Ele nos mostra que a vida espiritual não é feita de façanhas místicas, mas de fidelidade às pequenas cruzes de cada dia.
Ser cristão é aprender a fazer do ordinário uma oferenda.
Pedro fez isso com heroísmo silencioso. Seu exemplo não é para ser admirado à distância, mas seguido com coragem.
Em tempos em que a fé se dilui em discursos, ele nos convida a recuperar a linguagem antiga dos santos: o silêncio, a pobreza e a obediência. Que sua intercessão nos ajude a voltar ao essencial — e a descobrir, como ele descobriu, que o amor só é verdadeiro quando passa pela cruz.